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João Pessoa

Uma carta aos que SÃO, mas não ESTÃO

Há alguns anos, depois de ter passado por um processo de amadurecimento teológico, pastoral e de vida, escrevi o texto que você passa a ler. Amigos e leitores que já leram-no anteriormente, se identificaram com o que está escrito, se viram como num espelho, outros talvez tenham rechaçado o que foi posto, pois discordam veementemente de minhas palavras.

Independente de como você leu antes, quero lhe convidar a ler mais uma vez.  Se você discordou veementemente, disponha-se a olhar com misericórdia para o ‘outro’. Se você se viu no texto, desejo que olhe atentamente para algumas ponderações que quero fazer sobre o ‘ser, mas não estar’.

É especialmente para você que reescrevo esse texto. O faço com o coração cheio de paz, a paz do suave recomeço, a paz de um pecador que esteve errante, mas foi pego ‘pela mão’ misericordiosa do Redentor, do Supremo Pastor e por Ele foi reconduzido ‘estar’, pois nunca havia deixado de ‘ser’.  Leia com carinho…

Durante muitos anos critiquei as pessoas que se diziam cristãs, subscreviam as doutrinas evangélicas, mas simplesmente não queriam mais congregar. Sempre me utilizei de textos como “Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações, e tanto mais quanto vedes que o dia se aproxima.” Hebreus 10.25. Hoje depois de algum tempo convivendo com, e sendo mais um cristão protestante tenho algumas ponderações sobre esse assunto.

Conheço pessoas que de fato amam ao SENHOR, testemunham de Seu amor, graça e bondade, mas em determinado momento da caminhada resolveram tirar alguns pesos das costas. Servos que em dado instante viram que infelizmente a religião os afastava de Deus ao invés de aproximá-los. São ovelhas do pastoreio d’Ele, MAS foram feridas, magoadas, maltratadas e simplesmente se viram infelizes onde deveriam ser amadas, acolhidas, cuidadas, protegidas…

Continuo acreditando que é preciso congregar, que a igreja enquanto instituição é falha, mas que ainda é um ‘lugar seguro’. No entanto, preciso admitir que por muitas vezes, tem se tornado lugar de dor, de aflição, tristeza, decepção, frustração… Isso mesmo amado, hoje embora não concorde com essa postura, eu a entendo. Sim, consigo calmamente dizer que encontro motivos justos para “aqueles que são, mas agora não estão”.

Não estou falando de pessoas que se dizem cristãs, querem viver uma falsa fé e por isso não ‘aguentam’ ser Igreja. Refiro-me a pessoas que foram regeneradas, justificadas por Cristo, que se tornaram operosas, firmes no amor ao Senhor, mas que foram tão moídas e afligidas onde deveriam encontrar refrigério que não suportaram o peso e precisaram “descansar das cargas da religiosidade”. Sim, conheço pessoas assim. Gente fiel ao Senhor! Gente que O tem como Soberano.

Já vi pessoas terem o passado remoído, a honra manchada, o nome jogado ao chão. Vi também calúnias serem levantadas, falsos testemunhos, mentira, hipocrisia. Testemunhei pessoas sendo postas “de lado” porque não tinham os mesmos costumes ou por terem opiniões diferentes. Isso tudo em nome da RELIGIOSIDADE, dos ‘bons costumes’. Vi pessoas ‘crucificadas’ porque não baixaram a cabeça para o erro, porque não se subjugaram a decisões e posturas contrárias ao Senhor.

A fofoca, o disse me disse, a falta de amor, de solidariedade, de justiça, de perdão, as promessas vazias em pregações feitas para agradar o freguês e promover lágrimas fúteis são instrumentos usados pelo Diabo para simplesmente afastar pessoas da Igreja. E infelizmente preciso reconhecer que muitos líderes, muitos dos que deviam apascentar, apenas afugentam. São lobos em peles de cordeiro e querem devorar, destruir…

O pior de tudo é que não percebo esforços para trazer essa gente de novo para perto; é como se eles fossem descartáveis, indesejadas, imprestáveis… Até parece que existe alívio nos corações de muitos quando essas pessoas saem. O pastoreio perdeu-se em meio ao ativismo, ao evangelicalismo e a imensa postura empresarial e ditatorial das comunidades ditas cristãs. Fazem parecer que o pastor que vai em busca da única ovelha que ficou pelo caminho já não existe mais. A igreja tem deixado de ser IGREJA e por isso, perdido o seu perfil pastoral, cuidador, zeloso.

Sabem como passei a entender esses queridos? Quando comecei a refletir como eles, quando me senti como alguém que “é, mas não quer estar”. Adquiri um costume meio solitário, mas altamente devocional. Pego o carro e saio dirigindo acompanhado unicamente por Aquele que não me deixa em tempo algum. Nem importa para onde estou indo, apenas com quem estou… Nesses momentos ponho meu coração, sonhos, angústias, pecados, enfim, ponho-me diante d’Ele. Exatamente em situações como essa reflito sobre a coisa institucionalizada demais, burocratizada demais, medida demais, farisaica demais em que estamos transformando a NOIVA do Cordeiro.

Um dia desses percebi que não me encaixo nessa coisa toda. Não sou um desses supra-santos, não sou infalível, impecável. Sou um pecador miserável, sem dignidade, sem merecimento, sem bens… Sou um desses que simplesmente não cabem numa igreja tão cheia de exigências pretensamente morais.

Ah! Mas sou pastor, pensei eu. Isso era apenas um eco do que escuto sempre que “não agrado” aos fariseus, aos “donos”, dominadores. Senti nesse momento como resposta uma paz tão doce em meu coração ao ter em minha mente um eco da graça que me dizia: “seja ovelha, pois é apenas isso que importa”.

Hoje creio de maneira ainda mais convicta que é preciso congregar, que é preciso crescer junto, aprender, caminhar… É sim doce a comunhão dos remidos do Senhor. É sim, bom e agradável que vivam em união os irmãos (Sl 133). Sei que grande parte dessa gente que parou de congregar não optou por estar fora da Igreja, apenas libertou-se de uma igreja tacanha, mesquinha, fofoqueira, sugadora e nem um pouco pastoral. É triste constatar isso, mas infelizmente a grande verdade é que muitos dos que “estão não são e diversos que são não estão”.

Tenho orado pela Igreja, a bela Noiva do Cordeiro. Ela existe, é real, é acolhedora, amável, militante, proclamadora, piedosa, pastoral. É uma Igreja que ama o Seu Dono de tal forma, que não deseja outra coisa senão adorá-lO. E por ser assim, ela se ama. Por amar, cuida, protege, pastoreia. Essa Igreja, essa bela Noiva não exclui, ao contrário abraça e trata os feridos. Não aponta o dedo trazendo a tona o passado sujo do outro. Na verdade ela é instrumento do Senhor para restaurar as mais purulentas feridas.

Nas minhas orações, leituras da Palavra e em conversas com homens que temem a Deus, que O amam e que desejam honrá-lO em seus ministérios, fomos movidos pelo Pastor Supremo a entender que é possível buscar uma comunidade onde tais posturas, sentimentos e escolhas diárias sejam praticadas. Entendemos que é possível construir relacionamentos dignos do Nome que carregamos em nossas almas. É possível vivenciar ainda que de forma limitada as alegrias da verdadeira comunhão dos remidos do Senhor.

Por isso, reescrever esse texto é mais do que simplesmente para dizer que continuo entendendo você. Sim, continuo! E sinto-me do mesmo modo. Mas hoje meu coração está cada dia mais instigado, movido e altamente motivado pelo desejo de contribuir para que assim como eu e outros queridos, ‘você esteja de volta e viva o que é e jamais deixou de ser’.  Quero ser instrumento pelo qual o Senhor lhe conduz de volta ao CAMINHO DA REDENÇÃO.

Esse texto é para dizer que assim como eu e você, há uma ‘porrada’ de gente que ama o Senhor, que já sofreu um monte de mazelas pelas escolhas dos outros e pelas suas próprias. Uma gente que definitivamente não quer viver esse ‘evangelho superficial’ presente em muitos lugares. Um povo que apesar de desejar ardentemente um evangelho simples, relacional, amigo, pastoral, piedoso e relevante, ‘morre de medo’ de sofrer outra vez, de se decepcionar novamente e ter a alma moída. Sim, tem uma porção de gente que como nós, sente a mesma coisa. Essas pessoas precisam de alguém para caminhar junto, para bater um papo enquanto come uma pizza, para orar junto e para voltar ao CAMINHO DA REDENÇÃO.

Acho que já está na hora de você, eu e outros que somos, buscar outros que também são e estarmos juntos caminhando na busca por outros que ainda perceberão que são, até o dia em que de fato seremos um com o Senhor!

Sim, eu escrevi cada palavra dessa pensando em você. Em cada linha que reescrevi e em cada parte nova nesse texto, minha mente vislumbrou o rosto de cada irmão, irmã, filho e filha na fé, que o Senhor Deus me deu e que sei que apesar de ser, agora não está.  Por isso, ao ler imagine que eu estou falando diretamente para você, pois estou. Tenho certeza que você consegue me ‘ver’ falando cada palavra dessas. Mais que isso, você sabe que essa é uma verdade que arde em meu coração.

Meu grande desejo é que você redescubra a alegria de estar e que esse redescobrir lhe faça desejar trilhar com o coração repleto de alegria o CAMINHO DA REDENÇÃO.

Que o Supremo Pastor nos faça SER, mais do que simplesmente ESTAR!

Rev. Ricardo Jorge Pereira

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