O juiz Bruno Teixeira de Paiva determinou a reintegração de posse do prédio da reitoria localizado no Campus I da Universidade Federal da Paraíba, atualmente ocupado por estudantes que protestam contra a nomeação do reitor Valdiney Veloso Gouveia. As pessoas que ocupam o prédio devem sair, sob pena de multa de R$ 1.000 para cada dia de
Na decisão, o juiz afirmou que ”nem mesmo eventual alegação de exercício do direito de reunião ou de livre manifestação do pensamento respaldaria a invasão de prédio público, como forma de protesto, muito menos nos moldes ocorridos atualmente, com pessoas acorrentadas à porta de entrada da Reitoria, a fim de impedir o acesso de servidores, terceirizados, estudantes e do público em geral”.
Leia abaixo:
Trata-se de ação de reintegração/manutenção de posse proposta pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB em face de réus de qualificação desconhecida, com pedido de liminar, objetivando a expedição de mandado de reintegração de posse, com a consequente retirada de todos os requeridos que se encontram ocupando irregularmente a entrada da Reitoria da UFPB, campus universitário de João Pessoa, a fim de desobstruir o acesso ao referido prédio e suas instalações, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 por dia de atraso no cumprimento da ordem judicial, bem como de serem tomadas as medidas de força cabíveis, em caso de descumprimento da ordem judicial.
Para tanto, a UFPB alega que:
– é legítima proprietária e possuidora dos prédios instalados em seu Campus, os quais são caracterizados como bens públicos de uso especial, por serem essenciais à prestação do serviço público de educação de nível superior prestado pela autora, dentre os quais se inclui o da Reitoria, que foi invadido/ocupado por estudantes, desde a noite de 06/11/2020;
– os invasores estão impedindo o ingresso e o livre trânsito de servidores, terceirizados, demais alunos e pessoas em geral, mediante ameaças e colocação de cadeados nos portões;
– a invasão teve início a partir da nomeação, no dia anterior, pelo Presidente da República, do Professor Valdiney Veloso Gouveia, terceiro colocado da lista tríplice do Conselho Superior da UFPB, para o cargo de Reitor da Universidade Federal da Paraíba;
– desde então, os invasores permanecem na Reitoria da UFPB, com correntes e cadeados, impedindo o acesso de servidores, com ameaças e intimidações, em manifesto prejuízo ao funcionamento da instituição;
– as fotografias encartados à inicial comprovam o esbulho possessório praticado pelos estudantes no prédio da Reitoria da UFPB, e há receio de que aumente expressivamente o número de manifestantes dentro e fora da Reitoria, já que circulam pelas redes sociais calendários e convocações para novos protestos na Reitoria contra a nomeação do Reitor da UFPB, conforme provas acostadas aos autos;
– tais fatos inequivocamente estão provocando desordens e tumulto que podem resultar em danos à integridade física dos servidores, transeuntes da região, dos próprios manifestantes, bem como danos ao patrimônio da UFPB;
– diante de tal ameaça, antevendo a possibilidade de a Universidade ser posta em iminente perigo, inviabilizando suas atividades, é que se ajuíza a presente ação;
– os atos que estão sendo praticados pelo grupo, além de atentarem contra o patrimônio público e a liberdade de trabalho, passíveis de caracterização de ilícito penal, ameaçam/violam literal e visceralmente o direito de posse da autarquia federal em questão, que teve as suas dependências interditadas e, consequentemente, de se ver totalmente impedida do exercício das atividades que lhe competem, em decorrência do referido movimento;
– a ocupação no prédio da Reitoria da UFPB, além de colocar em risco a integridade de servidores e alunos no espaço físico da Universidade bem como os bens públicos envolvidos, está interferindo e limitando a liberdade de ir e vir dos que trabalham ou frequentam em suas instalações;
– restando infrutíferas as tentativas de negociação amigável, não restou à UFPB outra alternativa, senão socorrer-se do Poder Judiciário, para que seja permitido o livre acesso às dependências da Reitoria pelos servidores que desejam trabalhar, a fim de que todos os serviços e atividades sejam restabelecidos, com a realização de aulas e demais atividades, em homenagem à necessária continuidade do serviço público.
Relatei para o ato. Decido.
As declarações da demandante na inicial e os elementos de prova documental encartados aos autos denotam que o caso é de posse nova, ou seja, de menos de ano e dia. Logo, a teor do disposto no art. 558, do CPC/2015, o procedimento a ser adotado na espécie deverá ser o de manutenção e reintegração de posse, de maneira que o exame do pedido liminar deve ter como norte os arts. 560 a 563 do CPC/2015.
O art. 1.210 do CC/2002 dispõe que o possuidor tem direito a ser mantido na posse do imóvel em caso de turbação, restituído por motivo de esbulho, bem como segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Ademais, os arts. 560 e 561, ambos do CPC/2015, estabelecem que o possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado em caso de esbulho, devendo ele, no caso da ação possessória, provar a sua posse; a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; a data da turbação ou do esbulho; a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração.
Os arts. 562 e 563, do CPC/2015, preceituam que, estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada. Considerada suficiente a justificação, o juiz fará logo expedir mandado de manutenção ou de reintegração.
No caso dos autos, é fato público e notório, amplamente divulgado na imprensa local, a invasão ao prédio da Reitoria ocorrida após a nomeação do novo Reitor da UFPB, pelo Presidente da República, ato publicado no Diário Oficial da União de 05/11/2020.
As fotos coligidas à inicial, bem como as matérias publicadas em vários veículos de imprensa1, demonstram que os invasores ocupam irregularmente o local há mais de 70 horas, impedindo o acesso ao prédio da Reitoria.
A irresignação quanto à nomeação do Reitor da instituição não pode inviabilizar direitos e garantias constitucionalmente assegurados, como o direito de propriedade (CF, art. 5º, inciso XXII) e a liberdade de locomoção (CF, art. 5º, XV).
Nem mesmo eventual alegação de exercício do direito de reunião ou de livre manifestação do pensamento respaldaria a invasão de prédio público, como forma de protesto, muito menos nos moldes ocorridos atualmente, com pessoas acorrentadas à porta de entrada da Reitoria, a fim de impedir o acesso de servidores, terceirizados, estudantes e do público em geral.
Sobre o direito de reunião, a Constituição Federal estabelece, no art. 5º, XVI: “XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;”.
É certo que a liberdade de reunião é direito de estatura constitucional, que dá vazão à liberdade de expressão do pensamento e de comunicação (art. 5º, IV e IX, da CF), corolários do Estado Democrático de Direito.
Como toda garantia constitucional, porém, o direito de reunião não é absoluto, devendo ser sopesadas as circunstâncias em que exercido, para que não viole outros direitos fundamentais, a exemplo, no caso específico, de propriedade e da liberdade de ir e vir.
O direito de reunião, como delineado no art. 5º, XVI, da CF, depende apenas de prévio aviso à autoridade competente, quando exercido em local aberto ao público, pacificamente e sem armas.
Na presente situação, embora os manifestantes afirmem tratar-se de “protesto silencioso”, o ato está sendo praticado mediante esbulho, impedindo o livre exercício da posse, por parte da autora. E, ainda que, até o momento, não se tenha relatado violência por parte dos manifestantes, não há como considerar pacífica uma aglomeração de pessoas que está impedindo – além do já citado direito de ir e vir-, a regular prestação de serviço publico essencial ao bom andamento da instituição.
Desse modo, havendo evidência do esbulho realizado, tenho que, neste exame preliminar dos autos, restou demonstrado a probabilidade do direito na forma como alegado na inicial.
O perigo de dano se mostra evidente, eis que a autora encontra-se impedida de utilizar a área invadida para o desempenho de suas atividades institucionais.
Ante o exposto, defiro a tutela de urgência requerida na inicial, para determinar a reintegração da autora na posse do prédio da Reitoria do Campus I.
Determino a imediata expedição de mandado de reintegração de posse, devendo os Oficiais de Justiça, antes do seu cumprimento, intimar os manifestantes/ocupantes da Reitoria da UFPB para que desocupem o local, e de lá retirem todos os seus objetos.
Cientifiquem-se os réus/ocupantes de que, na hipótese de descumprimento do mandado de reintegração, haverá a desocupação forçada do imóvel, inclusive mediante o uso de força policial, caso essa medida seja necessária.
A Secretaria da Vara deverá notificar a UFPB imediatamente, inclusive por fax, telefone e/ou “e-mail”, para que indique, com urgência, o nome do preposto com poderes de recebimento do local, a quem caberá acompanhar a diligência de reintegração de posse a ser realizada por 02 (dois) Oficiais de Justiça.
Em seguida, o Diretor de Secretaria, depois de estabelecidas a hora e a data de cumprimento da diligência, comunicará ao preposto da UFPB o dia e o horário em que este deverá comparecer ao local, juntamente com os Oficiais de Justiça, para acompanhar o cumprimento do mandado de reintegração de posse.
No dia útil seguinte ao prazo anteriormente estabelecido, os Oficiais de Justiça deverão retornar ao endereço indicado juntamente com o representante da UFPB, portando o mandado de reintegração, ocasião em que certificarão quanto à desocupação, ou não, do bem, imitindo imediatamente a autora na posse do imóvel.
Quanto ao prosseguimento do feito, adote a secretaria as providências a seu cargo, tão logo decorrido o prazo da contestação.
João Pessoa/PB, (na data de validação no Sistema PJE).
BRUNO TEIXEIRA DE PAIVA
Juiz Federal Titular da 2ª Vara