A Justiça Federal rejeitou a denúncia do Ministério Público Federal contra o blogueiro Allan dos Santos por suspeita de incitação ao crime e de ameaça a Luís Roberto Barroso, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Em decisão desta terça-feira (24), a juíza Pollyanna Kelly Martins Alves, da 12ª Vara Federal de Brasília, afirmou que as declarações do responsável pelo Terça Livre, canal do Youtube, embora grosseiras e reveladoras de um estado de ânimo acirrado, “não consubstanciam ameaças sólidas muito menos traduzem-se em incitação a práticas de crime contra a suposta vítima”.
“O direito de liberdade de expressão dos pensamentos e ideias consiste em amparo àquele que emite críticas, ainda que inconvenientes e injustas”, afirmou.
“Em uma democracia, todo indivíduo deve ter assegurado o direito de emitir suas opiniões sem receios ou medos, sobretudo aquelas causadoras de desconforto ao criticado.”
Alves é a juíza que, no último sábado (21), rejeitou a denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no caso do sítio de Atibaia, ação penal da Operação Lava Jato que foi deslocada do Paraná para o Distrito Federal por decisão do Supremo.
De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal, Allan utilizou o Terça Livre para “desafiar o magistrado a enfrentá-lo pessoalmente”.
O apresentador é uma espécie de líder informal das redes bolsonaristas. É ligado ao vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho 02 do presidente Jair Bolsonaro.
“Allan assegurou na ocasião que seria capaz de fazer mal a Barroso se ambos tivessem contato fora dos meios digitais”, afirmou a peça de acusação.
Na avaliação da Procuradoria no DF, o caso superou os limites do razoável na livre expressão de pensamento e opinião e intimidou a vítima. Os fatos abordados na denúncia ocorreram em novembro do ano passado.
“No vídeo intitulado ‘Barroso é um miliciano digital’, Allan profere palavras de ódio, baixo calão e em tom claramente ameaçador, afirmando: ‘Tira o digital, se você tem culhão! Tira a p**** do digital, e cresce! Dá nome aos bois! De uma vez por todas Barroso, vira homem! Tira a p**** do digital! E bota só terrorista! Pra você ver o que a gente faz com você. Tá na hora de falar grosso nessa p****!”, descreve o documento.
Ao comentar o ataque hacker aos sistemas do TSE em meio às eleições municipais, Barroso afirmou que “milícias digitais entraram imediatamente em ação, tentando desacreditar o sistema”.
O magistrado declarou que havia suspeita de articulação de grupos voltados a desacreditar as instituições e muitos deles são investigados no STF. Era uma referência aos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos, apurações que miram bolsonaristas, incluindo Allan.
Para a juíza da 12ª Vara Federal, “dos fatos narrados não se extrai conduta apta a ensejar a tutela repressora criminal”.
“Deveras, o crime de ameaça não prescinde para a sua configuração da potencialidade lesiva da promessa de causar mal injusto e grave, situação inocorrente”, afirmou.
“E mais, o mal prometido deve ser concreto, dano físico, material ou moral, e também realizável, capaz, portanto, de atemorizar efetiva e objetivamente o destinatário, não apenas um mero receio.”
Ela afirmou ainda que as falas de Allan consistiram tão somente em “impropérios e bravatas que não denotam a seriedade e consistência da promessa, inapta, portanto, para incutir temor objetivo no destinatário”.
Em nota à imprensa divulgada no Terça Livre por ocasião da denúncia, Allan negou que tenha feito ameaças ao ministro do Supremo.
“O que foi tratado no programa foi o potencial dano à honra das pessoas da internet pelos termos empregados pelo ministro e eventual responsabilização legal do ministro na Justiça (‘para não sofrer uma ação’) por qualquer pessoa da internet que tenha se sentido ofendida”, afirmou, no comunicado.
O Terça Livre reproduziu a fala de Barroso na ocasião: “Uma versão contemporânea do autoritarismo são essas milícias digitais que atuam na internet, procurando destruir as instituições e golpeá-las, criando um ambiente propício para a desdemocratização”.
E, na sequência, a fala de Allan: “É um menino mimado, isso é que é o Barroso. Só que é um menino mimado perigoso, um menino mimado que defende liberdade pra maconha, é um menino mimado que fica chamando as pessoas de terroristas, aí bota o termo ‘digital’ para não sofrer uma ação”.